O Espírito Olímpico


Após o fracasso da grande esperança que era a Naide Gomes e mesmo a mais recente esperança Gustavo Lima, levantaram-se as más-línguas contra todos (ou quase todos) os atletas que voaram em direcção a Pequim.
Este é um tema um pouco complicado e não tão linear como se podia esperar. Não é justo estar a responsabilizar todos os atletas pelos maus resultados

Dizem que já é muito bom ir aos JO, que ser classificado já é o suficiente, estão entre os melhores do mundo. Isto, porque preencheram os mínimos. Mas na minha opinião, o trabalho de um atleta não se esgota quando se qualifica para uma competição. Se o objectivo é ir a determinada competição, espera-se que se participe nessa competição com todo o brio e não ir lá apenas ver como é uma competição olímpica – e não me venham cá dizer que não houve atletas que só foram com este espírito, porque houve várias declarações, incluindo a da própria Vanessa Fernandes, que chegou a dizer que se sentiu incomodada com a atitude de alguns dos atletas da comitiva portuguesa para quem era igual estar em 20.º como em 50.º lugar. Será isto a mentalidade de alguém que vai para uma competição, competir (desculpem a redundância) com outros atletas? Tentar ser o melhor? Durante muito tempo ficará a declaração de Marco Fortes, o lançador de peso português, que não conseguiu qualificar-se para a final: “Se não consegui mais é porque o meu corpo não deu. Vinha motivado e confiante. Apesar de a qualificação ser a esta hora da manhã, isso não foi um factor determinante”. “Apesar da qualificação ser a esta hora da manhã"? Bem, sem comentários…
Outro argumento que também já ouvi foi o de que muitos destes atletas não são profissionais. E? Isso impede-os de tentar exceder-se? O Nélson Évora não faz isto a tempo inteiro, é estudante na faculdade e treina antes e depois das aulas e ainda consegue ser um dos melhores. O Carlos Lopes trabalhava a tempo inteiro quando ganhou a maratona. Por isso, esta não é desculpa para justificar maus resultados, apesar de eu reconhecer que quem pratica uma modalidade desportiva a tempo inteiro terá mais facilidade e maiores probabilidades de atingir os níveis de resultados mais elevados.
Por outro lado, temos o facto de todas estas modalidades, ou pelo menos, muitas delas, terem poucos apoios financeiros. Se formos a comparar com o futebol – o dito “desporto-rei” – não é quase nada. O comentador do FCP no programa “O Dia Seguinte” lá se queixava do dinheiro que vai das autarquias para as várias modalidades desportivas – é claro que, tudo dividido não deve dar para muita coisa. É engraçado que para fazer estádios de futebol tudo se justifica (milhões para construir um local onde apenas há condições para praticar uma modalidade), enquanto os locais onde é suposto praticar todas as outras modalidades…enfim, será preciso dizer alguma coisa? Não há cultura do desporto no nosso país (tal como não há cultura da cultura...), apenas cultura do futebol e isto é responsabilidade tanto do Estado como dos meios de comunicação. Eu acho anedótico chamar a jornais como “A Bola”, “O Jogo” ou o “Record” jornais “desportivos”, onde 99,9% do conteúdo se dedica ao futebol (futebol? Aquilo é quase uma revista cor-de-rosa adaptada ao sexo masculino) e talvez uma página ou duas amontoa os momentos mais importantes do resto dos desportos. Enfim…Concordo com um treinador para-olímpico que dizia que o problema está na organização – mas não vamos desresponsabilizar os atletas na totalidade. A responsabilidade destes resultados é partilhada e explica porque é que não há evolução nos resultados portugueses nos jogos olímpicos há anos.


19 agosto 2008

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